11 de jul. de 2012

‎"O ópio das massas" e a crença/descrença religiosa

‎Por Rodrigo  Oliveira
Profº Drº visitante da FURG
"O ópio das massas" e a crença/descrença religiosa
(dedico este texto aos meus alunos Felipe Vargas da Fonseca eDouglas da PJ)

Como intelectual abertamente de esquerda costumo ser visto como ateu. Isto ocorre seguidamente. Certa vez uma turma fez um bookmaker para saber qual era a minha posição: se eu acreditava ou não em uma força superior e, em caso positivo, qual era a minha religião. Chegava a ser engraçado ver os alunos me abordando nos corredores e criando diálogos apenas para tentar extrair o que eu acreditava. Para meu divertimento e desespero dos discentes sempre falava coisas diversas e que não poderiam levar a conclusões.

A vinculação entre esquerda e ateísmo vem de longa data. Durante muito tempo no mundo ocidental a Igreja Católica Apostólica Romana deteve muito poder no “céu” e na “terra” e comandava com punho de ferro o destino de milhares de pessoas. Logicamente, quem tem poder sempre faz de tudo para mantê-lo e por isso não media esforços para tal empresa, mesmo que isso fosse contra o mandamento de “não matarás”. Por essa relação de opressão muitas das rebeliões populares tinham como elemento central a iconoclastia em relação a figura da Igreja. Para muitos as igrejas protestantes não ficavam atrás, pois defenderiam a ordem burguesa com unhas e dentes. Em outras palavras, a “ética protestante” seria a ética do lucro. O poder ideológico das religiões era tanto que Marx cunhou a célebre frase: “a religião é o ópio das massas”. 
Essas palavras geraram um grande problema de interpretação, pois muitos passaram a compreender que Marx defendia o ateísmo. Os detratores e defensores de Marx adotaram isso como dogma e, por sua vez, acabou se tornando doutrina. Marx não acreditava em Deus e isso é um fato. Porém, não lembro de ter lido algo escrito por ele contra a crença em Deus. O que Marx se opunha era ao poder das religiões e domínio que exerciam sobre as pessoas naquele período específico. Lembrando que sempre estavam atreladas aos interesses dos poderosos, ou seja, aos interesses da nobreza decadente e da burguesia ascendente. Percebam que a frase não é “Deus é o ópio das massas” e sim “A religião...”. Um erro de interpretação que fez muitos desacreditar na palavra divina e outros tantos a odiar o pensamento marxista. 
Por outro lado, esta frase tinha um impacto muito grande, pois ainda havia uma relação muito próxima entre Estado e Poder religioso. Hoje em dia isto se diluiu, embora ainda exista grande influência clerical nas políticas dos Estados nacionais. O exemplo mais próximo de nós foi a pressão do Vaticano para que Fernando Lugo aceitasse o golpe de estado. Logicamente, o interesse do Papa e seus asseclas não era o bem estar do povo paraguaio e sim os interesses das oligarquias e dos donos do capital.
Por outro lado, quando olhamos a história dos movimentos populares e as rebeliões sociais um dado chama a atenção: enquanto as altas hierarquias clericais sempre ficam ao lado dos interesses dos poderosos, os setores mais “baixos” quase sempre ficam ao lado do povo. Ou seja, nota-se que em épocas de crise padres e pastores quase sempre ficam ao lado dos desafortunados e não são poucos que sofrem a repressão junto com os pobres. A Teologia da Libertação é um exemplo disso.
Isso me faz lembrar a figura histórica de Jesus Cristo. Ele foi assassinado acima de tudo pelo fato de ficar ao lado dos pobres e se opor violentamente à corrupção da alta hierarquia religiosa hebraica, que oprimia e extorquia o povo hebreu. Não esqueçamos que Cristo era um rabino (mesmo que muitas igrejas cristãs omitam isso), e suas ações sempre foram voltadas para apontar os erros dos poderosos acantonados no Sinédrio (uma espécie de conselho que reunia a alta hierarquia hebraica). Foi a conspiração dos poderosos que levou a morte de Cristo, não o povo hebreu como se construiu no imaginário cristão.
Na minha humilde opinião não há problema algum em um militante de esquerda ter crenças religiosas, não há incongruências entre os princípios religiosos e a luta popular. Aliás, esta suposta oposição sempre foi uma arma dos donos do poder para detratar a esquerda.
Quanto a mim, há muito tempo deixei de me preocupar com questões de fé. Não sou ateu, pois não desacredito. No entanto, para mim é indiferente se existe ou não. Quando eu morrer hei de descobrir: se minha consciência se extinguir significa que os ateus estavam certos, se tiver alguma coisa além então estão errados. Seja como for, em minha vida a crença religiosa não é algo importante. Porém, como sempre defendo os pobres e os oprimidos diante da opressão dos poderosos, não tenho o menor pudor em chamar Jesus Cristo de companheiro. 

1 comentários:

observador disse...

Concordo com o texto e resumo o mesmo com a frase muito utilizada pela esquerda latino americana nos anos 70: "Quanto mais leio o camarada Marx, mas me aproximo do irmão Cristo".

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